Friday, July 29, 2005

homorural

O trabalho de que nasceu este blog é sobre vivências homossexuais em espaço urbano…mas as questões da espacialização das questões relacionadas com a homossexualidade interessam-me noutras perspectivas…
Por isso e no âmbito da intervenção da não te prives nasceu em 2004 o projecto O projecto “Homossexualidade em Espaço Rural - Conhecer para Agir”

Este é um projecto de investigação/acção promovido pela não te prives - Grupo de Defesa dos Direitos Sexuais e pelo portal PortugalGay.PT e que tem como objectivo conhecer as condições de sociabilidade da população LGBT portuguesa que vive em espaços rurais.

O inquérito deste trabalho estará on line até domingo… por isso até lá e preencham o questionário…

Thursday, July 28, 2005

Uma noite final...

Ontem terei terminado o meu trabalho de campo...
E terminei com um conjunto de situações que não só enriqueceram interessantemente o meu trabalho, mas também porque me fez pensar nos momentos que ao longo deste ano funcionaram como espaços de capacitação e de trabalho etnográfico.

O minha noite começou assim com um jantar de “despedida” de uma das minhas informantes que vai voltar para a terra natal. O jantar realizado numa dos restaurantes da alta, foi divertido. Éramos umas quinze pessoas, na sua maioria amigos da “moçoila”. Como comentei com o Silvio, aquele jantar junto o maior número de lésbicas se que me recordo em Coimbra, e foi um espaço animado onde a maioria das pessoas presentes se divertiu.
Pelo tipo de sociabilidade que a população lésbica tem, ao longo deste ano não foram muitas as situações em que tive oportunidade de ver um ajuntamento assim. Mais tenho a sensação que um dos riscos do meu trabalho passa por esse “ausência” de referências às vivências lésbicas.

Interessantemente este derradeiro dia de trabalho de campo talvez tenha trazido algo de novo neste aspecto. Isto porque terminado o jantar fomos beber copos ao Quebra Costas, e a de novo olhei para a Esplanada e vi um número de lésbica pouco habitual naquele espaço. Vários casais estavam por ali numa de namoro, calmas e tranquilas, com alguns gestos de carinho (mais ou menos óbvios) e olhares apaixonados. Animado comentei isso com alguns e algumas das minhas informantes presentes que se riram com o meu espanto.
Bebi... e recordei que talvez esta fosse a última vez que iria a este espaço com aquela intenção...

Depois... resolvi “ir ao chá”...
Conseguida a boleia com um amigo... dirigimo-nos para a Ponte Açude e a partir de aí a animação não mais parou... estavam dezenas de carros a circular no novo chá – agora deslocado para a área junto Bencanta – e como me foi referido por um dos meus informantes que por lá encontrei as ultimas noites tem sido muito animadas.
Recordei então as mudanças que se deram nos últimos tempos no “chá” e o modo como o espaço se está reconstruindo como espaços de encontro e sociabilidade para parte da comunidade gay da cidade.

Sunday, July 24, 2005

saudades



A minha cidade... a cidade que tem sido alvo do meu estudo, está hoje diferente... vejo-a diferente...

Sinto que a emoção da saudade me está a dar um outro olhar sobre Coimbra...
Que significado tem esta emoção
?

uma academia crítica?

A geografia parece muitas vezes uma ciência conservadora…
A verdade é que na sua história muitos foram aqueles que pelos seu pensamento e trabalho cientifico, agiram numa lógica política conservadora.
Friedrich Ratzel é o exemplo internacional, tendo parte do seu pensamento sido usado pelos teóricos do regime nazi. Por terras lusas a obra de Amorim Girão é um paradigma de ligação entre o regime salazarista e a academia coimbrã.

Mas, a geografia tem também inúmeras figuras cuja obra se torna essencial no pensamento e acção da esquerda, não apenas partidária mas essencialmente social. Destaco pessoalmente David Harvey e Milton Santos como exemplos de académicos cuja obra é essencial para a transformação social.

Entre os mais jovens encontramos inúmeras figuras que tem vindo a se destacar como académicos, mas também como activistas.
A editora de livros on line Praxis (e)Press localizada na Okanagan University College, Vernon, e na University of Victoria, Victoria, British Columbia, Canada, editou no ano passado um interessante livros intitulado “Radical Theory/Critical Practice: Making a Difference Beyond the Academy?”





Este volume, editado por Duncan Fuller e Rob Kitchin, destaca…

“For the past thirty five years geographers have systematically engaged with radical and critical theory to examine and expose uneven, unequal, exploitative and oppressive socio-spatial and environmental relations. By drawing on and developing different theoretical traditions — such as Marxism, feminism, and poststructuralism — they have shared an ideological commitment to challenge injustices and seek positive change. More recently, however, many have started to question the extent to which radical/critical geographers actually do make a difference beyond the academy; whether they really are changing the situation on the ground for everyday people in everyday places. The works in this volume examine this contention and investigate how radical/critical geographies might proceed. Drawing on their own experiences of seeking to ground radical theory through critical praxis, the contributors vibrantly explore the role of the academic in society; the relevance and meaning of 'making a difference' beyond the academy; the relationship between academic praxis and activism; and the neo-liberal threat to enacting certain kinds of critical praxis."

Neste sentido esta é uma obra para todos, geógrafos ou não, lermos sobre o papel da academia no activismo…
Dos seus diferentes capítulos destaco:
- "Radical Theory/Critical Praxis: Academic Geography Beyond the Academy?” que corresponde à introdução escrita por Duncan Fuller e Rob Kitchin;
- “Exploring Boundaries of Professional/Personal Practice and Action: Being and Becoming in Khayelitsha Township, Cape Town” de Paul Cloke;
- “A 'Politics of Local Politics': Praxis in Places that Matter” de Pamela Moss;
- e “Moving Beyond from Within: Reflexive Activism and Critical Geographies” de Larch Juckes Maxey

Friday, July 22, 2005

que geografia de cidade

Escrevo muitas vezes sobre uma cidade que a maioria de vós pensa que conhece… os espaços de que falo são uma presença no vosso quotidiano… mas tantas vezes as descrições que leio desta cidade nas obras da geografia portuguesa me fazem parecer que há uma mecânica estranha no olhar geográfico da cidade de Coimbra…

Os livros, as teses de mestrado e de doutoramento, os artigos científicos…
São milhares de páginas escritas sobre estas cidade em que poucos de nós se reconheceram…

Quando me decidi a fazer este trabalho tinha da geografia urbana um olhar distante e critico de uma investigação fortemente centrada nas questões da funcionalidade do espaço urbano.

Hoje sei que é possível fazer “uma outra geografia urbana” de Coimbra… uma geografia urbana, de âmbito social e cultural, que realce os modelos de sociabilidade e percepção de um grupo social específico… os homossexuais

Ficam aqui algumas dúvidas:
- interessará a alguém a investigação sobre esse grupo social?
- que efeito terá este estudo no olhar da cidade por parte da própria comunidade lésbica, gay e bissexual?
- que “cidade queer” se pode, ou deve, mostrar?

Tuesday, July 19, 2005

compras

Ontem depois do jantar fui fazer um compras no Jumbo, no Dolce Vita, necessitava de várias coisitas para a minha casa: leite e fruta e outros “pormenores” caseiros.
Enquanto me passeava nos corredores procurando as minhas compras... cruzei-me com dois dos meus estudados...
Depois de um cumprimento, delicado mas de circunstância, mantive-me atento. Eram cerca de 21 horas, e o Jumbo estava cheio de gente em compras desenfreadas... na frutas encontrei outro casal... o namorado de outros dos meus informantes comprava produtos de higiene pessoal... ou o encontro com o Mário R.
O Mário R. é um dos mais velhos, em idade, dos meus informantes: divorciado, com cerca de 60 anos, reformado, é uma das pessoas de mais informação e “histórias para contar” dentro da comunidade. O Mário R. referiu na nossa pequena conversa como o Dolce Vita se transformou num dos locais de encontro da comunidade gays ao final da tarde.
Divertidíssimo o Mário R. riu-se e contou-me algumas histórias divertidas de engate e de “bichice” que por ali se têm vivido nas últimas semanas. As histórias que me contou reforçaram a “percepção de anteriores visitas de campo que tinha realizado naquele espaço: a importância dos espaços comerciais deste tipo, como locais de anonimato e ao mesmo tempo de encontro da “comunidade”.

Monday, July 18, 2005

etnografia e sentimentos!

Que o trabalho etnográfico mexe com os sentimentos do investigador e do investigado é coisa estabelecida por milhares de páginas escritas por etnógrafos e metodólogos sociais. Ao longo deste ultimos meses tenho lido bastante páginas sobre esta temática, bem como, tenho reflectido sobre a profusão de sentimentos e emoções que a minha investigação etnogeográfica me tem provocado…

Um dos lugares em que as emoções se têm cruzado comigo, é na leitura de outros textos, que tantas vezes nos vão deixando marcas metodológicas, teóricas ou epistemológicas. Esses textos são companheiros de algumas tristezas e alegrias no trabalho solitários do investigador… são esses textos que nos vão fazendo companhia dos dias que passam e que vamos construindo no quotidiano.

Há alguns meses comprei um livro que me chamou à atenção numa viagem pela net. Between Gay and Straight – understanding friendship across sexual orientation de Lisa M. Tillmann-Healy.



Num primeiro contacto com esta obra… fiquei com a ideia de que posteriormente valeria a pena um leitura atenta, mas que não seria algo prioritário para o meu processo de investigação actual.

Na semana passada, numa noite de maior insónia, precisava de uma leitura que me distraísse um pouco. Peguei no volume, branco e verde, e na esperança de encontrar uma leitura que me ensonasse comecei a ler…

Ao longo dessa noite li cerca de 80 páginas… afinal a obra envolveu-me… retirou o pouco sono que tinha e ficou marcando-me ao longo da ultima semana em que nos pedaços de tempo que fui construindo foram consumidos por essa leitura apaixonante…
A obra é um “brilhante” estudo sobre as relações de amizade entre “gays” e “hetero” e um apaixonante trabalho de “etnografia narrativa”.

Imperdível…

Monday, July 11, 2005

uma carta

Caro Paulo,

Certamente não se lembrará de mim, uma vez que fomos apresentados no Pride de Lisboa há 3 anos e não nos voltámos a encontrar depois disso.
Tenho seguido atentamente os seus blogs, pelos quais o felicito, e - com efeito - partilho do sentimento (que creio ser comum à comunidade homossexual da região centro) de que faltam locais assumidamente gay em Coimbra.
Em pesquisa também por sites da Rede Ex-Aequo (à qual não pertenço por ter já wxcedido a idade... Estou já nos quarenta...!) vi referidos bares como o Pitchclub, o Moelas Bar, o Piano Negro, o Santa Clara Galeria Bar, o Cartola, o Tropical e o Café da Praça Verde, sendo mais frequentados pela nossa comunidade o Quebra Costas e o Shmoo Café.
Embora natural de Coimbra e trabalhando aí, resido na Figueira da Foz há mais de 11 anos, pelo que - dos sítios referidos - apenas conheço o Galeria Bar, o Cartola e o Tropical, para além do "imortal" Quebra Costas.
Na Figueira existiu em tempos o Bar La Belle Époque, que frequentei várias vezes com a minha Mulher, até fechar, uma vez que o dono optou por ficar com um Restaurante na Costa de Lavos e passar o Bar, que - tanto quanto sei - continua fechado... Nesta zona, para a comunidade gay (e aqui essencialmente para homens) subsiste a praia da Cova, junto ao Parque de Campismo da Orbitur, na Gala, e nada mais.
Confesso que, se me desloco muitas vezes a Leiria, ao Porto e até a Lisboa, certamente que - se houvesse locais assumidamente gay em Coimbra ou arredores - mais facilmente me deslocaria aí, como outras pessoas residentes na Figueira, Aveiro, etc.
Embora em Coimbra só haja locais "gay friendly" era bom que os mesmos fossem divulgados continuando-se na esperança de que, em breve, possamos contar com um bar ou discoteca voltado para a nossa comunidade... Fica a esperança!
A verdade é que o assumir, em parte, é ajudado por esses locais, e isso facilitaria a "abertura" das mentalidades de uma cidade que se arvora em universitária e, consequentemente, deveria ser aberta...!
Confesso que na Figueira (teoricamente uma cidade mais "provinciana"..., mas que - felizmente - é mais aberta de mentalidades, talvez pela afluência de turistas) ando de mão dada e abraçada na rua com a minha Mulher e somente uma vez se ouviu um comentário de um idoso que, além do mais, vinha já bastante "regado"...! De resto, nunca fui (fomos) discriminada(s) ou "olhada(s) de lado". Penso que o assumir é um passo importantíssimo para a mudança de mentalidades!
Mais uma vez, parabéns pelo seu trabalho!
Ao dispor,
Maria Duarte

Saturday, July 09, 2005

espaços de estudo

Junho e Julho são meses difíceis para os estudantes universitários: exames e mais exames.

Esta época transforma os espaços públicos da cidade, reconfigurando a geografia da comunidade universitária: a calma dos edifícios universitários (exceptuando claro, das suas bibliotecas que abarrotam nestes dois meses), lugares para estacionar, relativa calma em bares e discotecas.
Mas em contraponto outros lugares são invadidos de apontamentos e livros: as já referidas bibliotecas universitárias, mas também a biblioteca municipal; alguns cafés na cidade em que se destaca o Santa Cruz; e em especial, talvez pela sua centralidade, o Bar do TAGV e a Sala de Estudo da AAC.

A estes dois são espaços ao qual dediquei algum tempo de observação.

A Sala de Estudo da AAC é um espaço (de grande “sabor” pessoal onde estudei mais de quatro anos da minha vida de estudante) frequentado por cerca de 100 estudantes dia (o que demonstra o quanto é insuficiente nesta época) e que tem como marca a sua multiculturalidade, pois são bastantes os alunos do PALOP aqui presentes. Nas duas tardes que por cá passei durante este mês e em que estive a ler textos sobre a cooperação transfronteiriça entre Portugal e Espanha... tive no entanto oportunidade de observar atentamente outro tipo de dinâmicas neste espaço. Um dos meus informantes, o Luís G. que esteve por lá referiu que “já por aqui engatei!”. Na realidade também eu recordo algumas história de engate naquele espaço, mas o Luís G. reafirmou que são habituais alguns estudantes homossexuais naquele espaço, e que “o pessoal costuma conversar e fumar uns cigarros nos intervalos do estudo e por vezes quem sabe se pode conhecer alguém por aqui!”. Alguns poderão se questionar como acontecem estes “encontros” mas a verdade é que depois de algumas horas de estudo apetece mesmo começar a olhar para o vizinho e começarmos a observar atentamente aquele olhar, aquela boca, ou um outro qualquer pormenor...

Já quanto ao espaço do Bar do TAGV a minha observação tem sido feita em algumas tardes de fim de semana, ou finais de tarde em que ponho a escrever no meu portátil. Por lá uns vinte estudantes sentam-se com os seus livrinhos e muitos apontamentos a estudar para o exame. O bar, com a sua música calma, luz natural – imensa- e a gente “bonita” que por lá passa transforma-se num óptimo local de trabalho e estudo. Mas como já em outra ocasiões referi este é também um espaço importante de encontro homossexual o que me levou, algumas vezes, a olhar atentamente quem por lá estudava. Claro que não foi difícil encontrar jovens estudantes homossexuais a estudar por lá.

Hoje deixei-me estar a observar tranquilamente este espaço... fui escrevendo durante a tarde coisas sobre o meu “trabalho das fronteiras”, mas com um olhar, ou outro, aos homossexuais, masculinos e femininos presentes, e ao seu comportamento.
O meu olhar esteve assim atento a um conjunto de percepções relacionadas com estes espaços como espaços de sociabilidade da comunidade gay e lésbica da cidade. Se na sua lógica funcional habitual – lugar de café à hora de almoço e do jantar, ou de fino ao final da tarde - este espaço é muitas um local de encontro da comunidade, nesta nova lógica funcional de “espaço de estudo”, é reincidente a presença de homossexuais. Entre o casal gay que estuda próximo e que de vez em quando faz um intervalo para um gesto de carinho; a jovem lésbica embrenhada num monte assustador de fotocópias, mas que lança um olha a quem entra; ou os dois amigos gays que estudando comentam, entre sorrisos, quem entra e quem sai...

Thursday, July 07, 2005

Saquei a comunidade do armário?

Hoje numa conversa com o Filipe confirmou-se um dos meus receios: parte da comunidade gay e lésbica da cidade de Coimbra manifestou algum “receio” do processo de investigação que tenho levado a cabo.

Sabia desde o início que a visibilidade criada ao investigar uma comunidade e fechada como a de Coimbra poderia colocar alguns riscos de fazer o “outing” da mesma… Sabia por isso que corria o risco de riscos tornar pública uma comunidade que não terá vontade de que isso aconteça.
Isso naturalmente preocupava e sabia que teria de criar estratégias que evitassem isso…

O Filipe disse-me que algumas pessoas resolveram comentar no canal do IRC #gaycoimbra algumas supostas afirmações mediáticas minhas, que na realidade não aconteceram. Talvez se estivessem a referir a este blog e a referências a alguns espaços e situações que de um modo narrativo vou colocando no blog com o objectivo de serem alvo de comentários por parte da comunidade.
Estas referências que, pelo que parece não foram simpáticas, nasceram de um dos espaços virtuais de sociabilidade da comunidade gay (a presença de mulheres é um acontecimento extremamente raro) que na minha metodologia de investigação deliberadamente decidi não usar pelo facto de que sendo um espaço onde o anonimato é uma constante fundadora, me pareceu que dificilmente teria resultados positivos e conclusivos.